A 6 de Junho de 1966, Robert Kennedy num discurso proferido na Universidade da Cidade do Cabo, África do Sul, referiu a existência de uma maldição, supostamente de origem chinesa, que se profetiza a terceiros, desejando-lhe “que vivas tempos interessantes”.
“Queiramos ou não”, referiu Robert Kennedy em 1966, “vivemos atualmente tempos interessantes”!
Acontecimentos como a ida do homem à lua, Maio de 68, A guerra do Vietnam, passando pela “falência” do modelo de Bretton Woods, as crises petrolíferas, foram, de facto, tempos realmente interessantes na sua dupla acepção.
Os anos sessenta e a viragem para os anos setenta, representaram o termo de um período de elevado desenvolvimento socioeconómico, traduzindo o culminar da reconstrução europeia e os anos dourados para o desenvolvimento das economias ocidentais.
As contradições internas da acumulação de capital constitui um dos conceitos centrais da Teoria das Crises, associada a modelos Marxistas e cujo fenómeno é também explicado pelas teorias neoclássicas, referindo-as como “Risco Sistémico”.
Nestas abordagens conceptuais, a política e a prática económica nunca resolvem os seus problemas de forma estrutural: transferem-nos para outras geografias criando soluções que serão a origem dos problemas das décadas seguintes.
Poderemos questionar se esta característica é exclusiva do modelo capitalista ou advém da própria condição humana, não obstante, o início da década de setenta representa um período de forte estagnação económica, de congelamento salarial, de falência do modelo de desenvolvimento assente no pleno emprego e no modelo industrial pós Segunda Guerra.
De facto verificou-se na Europa e no mundo ocidental, nesta época, um período de redução significativa da competitividade das suas economias com repercussões graves a nível político-social.
A solução para esta crise económica que se viveu até meados da década de oitenta, refletiu, premonitoriamente, o previsto nas análises conceptuais referidas, traduzindo-se na “offshorização” da produção, através da deslocalização da indústria para países em vias de desenvolvimento e aumento artificial dos salários e do poder de compra das economias ocidentais, através do crescimento exponencial do crédito.
Esta explicação muito simplificada reflete aquilo que assistimos na época Thatcher-Reagan e posteriormente, amplificado com a desregulamentação dos mercados financeiros, justificando com particular acuidade o poder atual das instituições financeiras no quadro político mundial, fenómeno também referido no século XIX.
Como se não bastasse, o previsto nas teorias económicas citadas não nos é nada favorável pois, segundo Marx, secundado pelos neoclássicos, estas tendências simultâneas e interligadas, de queda dos salários (competitividade das economias) e de aumento da dívida, levam a uma cascata de incumprimentos “credit defaults”, culminando numa falha das instituições, traduzindo o referido “risco sistémico” dos neoclássicos.
As teorias referidas e a prática político-económica resolvem estas crises exportando-as para outras geografias, limitando os danos aos seus concidadãos, retirando algum sentido às manifestações dos vários indignados nas ricas economias ocidentais mas colocando uma enorme pressão nas frágeis economias e nos cidadãos de outras geografias, menos preparadas.
A crise ou os “tempos interessantes” que se vivem atualmente encontram assim explicação na forma como saímos da crise anterior fornecendo indicações preciosas sobre como vamos entrar na crise seguinte, dando um sentido profético às palavras de Robert Kennedy.
PS: Dois anos mais tarde, em 1968, nesse mesmo dia 6 de Junho, Robert Kennedy viria a falecer vítima de um atentado, encerrando um período particularmente negro da política americana.